sexta-feira, 31 de julho de 2015

Especial Thierry Mugler - Resenha: Alien Eau De Parfum, por Gabriel Villa


Alien, o perfume majestoso de Thierry Mugler: é assim que começaremos hoje. Aliás, por onde começar quando estamos falando de um perfume assim, tão complexo, grande, que representa tantas coisas? Por um momento eu paro, coloco a cabeça pra pensar e realmente, o que mencionar primeiro? Talvez que é mesmo um perfume majestoso! Um perfume que, se você permitir, vai te levar por uma jornada nas terras quentes das Arábias, te fazer sentir maravilhas e viver intensamente as mil e uma noites de Sherazade.

Eis que, lançando seu perfuminho alienígena nos primeiros anos do novo milênio, Thierry Mugler revoluciona mais uma vez ao trazer uma composição tão simples, porém que causa tanto impacto, que impressiona tanto, e que faz boa parte dos perfumes que cheiramos todos os dias parecerem banais e desinteressantes. Alien é mesmo uma aventura! É desbravar terras longínquas, é sentir as altas temperaturas do Oriente, é se vestir com o poder de um talismã que parece ter sido encontrado em escavações arqueológicas, e que remonta a um passado distante. Ancestralidade num frasco, nos diz Thierry Mugler.


Ao ser borrifado, Alien Eau de Parfum explode em todo um mundo de jasmins: se a marca quer nos trazer um perfume de outro mundo, eles então nos levam a outro planeta. Os jasmins são frescos, mas são pungentes; são voláteis, mas encorpados; parecem ter mil e uma facetas, desde o ligeiro cítrico mentolado que assalta o nariz inicialmente até o aveludado das pétalas puras e o óleo essencial rico que delas escorre. Aqui temos toda uma abertura, pois Alien é mesmo um perfume que sabe fazer uma entrada triunfal. Os jasmins florescem, e desabrocham, e brotam, quando todo o frescor e a ligeira sutileza começam a ser tomadas por um aspecto quente, incensado, que vai ficando cada vez mais mineral, levemente terroso, em todo um banho de âmbar com madeiras. A fragrância, porém, nunca deixa o tom sedoso, e o jasmim continua eternamente lá, revelando-se graciosamente a cada instante de uma forma diferente, mutando-se, castigando quem não o suporta e hipnotizando quem o aprecia. Alien me faz pensar numa grande feira árabe a céu aberto, debaixo do sol, com incensos por todos os lados; mercados, com comércio de óleos perfumados, de tapetes persas, de ricos tecidos; penso também em grandes jasmins aquecidos pelo astro maior, e castelos de sultões com belas dançarinas, comemorações e banquetes. Alien é mesmo um casamento ao melhor estilo oriental, um casamento entre jasmim e âmbar que resultam em um aroma majestoso, que definitivamente nos transporta para além do nosso cotidiano.

Alien é um perfume imperativo, enorme, gigantesco, único. Sua potência é de impressionar, é de acabar com apetites e destruir jantares, é de impor e causar impressão, não se importando se é ela boa ou não. Alien é um perfume, apesar de sua sutileza e sua história, um perfume arrogante e impetuoso, que gruda na pele e não sai mais e projeta ondas poderosas de aroma no ar, o tempo todo. Um dos perfumes mais intensos que já usei, e que realmente, ao usá-lo, me fazem sentir a pessoa mais linda e mais interessante do mundo.

Não tenhais medo, porém. Alien é uma experiência que vale ser vivida; é um perfume que parece que tem vida própria, que não se sabe de onde vem, pra qual direção vai e o que vai fazer no minuto seguinte. É aquele paradigma entre o que dá medo e o que fazemos questão de idolatrar, pois de tão lindo, às vezes nem sabemos entendê-lo. E a repulsa que pode provocar, quando comparada com as sensações extraordinárias que nos trazem, são quase irrelevantes. Deixai o alienígena vos abduzir, e boa viagem.

quarta-feira, 22 de julho de 2015

Especial Thierry Mugler - Resenha: A*Men


Após trazer o icônico Angel para sacudir o mundo perfumístico, era hora de inovar também no mercado masculino. A casa Thierry Mugler então fez, ao meu ver, uma jogada de mestre juntando notas tipicamente encontradas em perfumes femininos, inclusive em sua própria estrela, e lançando sob um rótulo masculino. Temos aí A*men!

Lançado em 1996, é uma releitura do Angel EDP feminino com adição de notas um pouco mais picantes e frescas para trazer equilíbrio e um ar mais reconhecível dentre fragrâncias rotuladas como masculinas.

Seu frasco é de vidro com uma capa de borracha cobrindo boa parte dele, visível fica apenas uma estrela por onde podemos acompanhar o líquido. Seu borrifador é pouco eficiente, necessitando de cortes na borracha que cobre a região para melhor aproveitamento. Com o passar do tempo também foram criados frascos com capas em outros materiais, como o metal.


Ao borrifá-lo na pele, sinto logo uma intensa mistura de lavanda, coentro e hortelã formando um acorde verde e refrescante ao mesmo tempo. Juntamente, o patchuli dá as caras daquela típica forma "suja" que marca a linha, mas aqui ele está integrado com as outras notas, sem gritar por atenção como na versão feminina.

Essa abertura engana bastante e pode parecer com ela que se trata de um perfume bobo e banal. Mas como nada na casa Mugler é bobo e muito menos banal, após trinta minutos ele mostra a que veio.

Quando as notas iniciais somem, entram em cena leite, mel e caramelo, além das listadas como notas de fundo café e baunilha, formando um acorde que só posso definir como cafeteria. É um café com leite cremoso com aquele toque caramelado que sentimos assim que pisamos em uma. Delicioso!

O patchuli está ali trazendo sua assinatura angelical típica, mas tão diluído em meio as demais notas que nem se destaca demais. Esse coração dura por longas doze horas, fazendo-me deliciar.

Na última fase da evolução resta basicamente o persistente patchuli e um doce atalcado amadeirado (benjoim?? cedro??) que não consigo decifrar bem, mas é muito aconchegante. Esse fundo dura ainda por mais três horas até a despedida final.

Surpreendentemente, em minha pele ele não tem uma projeção monstruosa como vejo relatos por aí, é algo como uma nuvem de perfume ao meu redor, sem invadir o ambiente. Essa característica, juntamente com um patchuli menos presente e destaque maior para notas mais gourmand, o deixa bem mais agradável que Angel.

A*men poderia ser facilmente um perfume feminino ou unissex, mas sendo rotulado como masculino serve para provar que a perfumaria pode sim inovar e lançar notas e estilos tipicamente femininos também para homens e que os homens podem usar perfumes com as notas que quiserem sem pensar muito em rótulos.



sábado, 18 de julho de 2015

Especial Thierry Mugler - Resenhas: Angel Aqua Chic e Angel Eau Sucrée


Dando continuidade ao especial dedicado à casa Thierry Mugler, trago hoje uma resenha dupla de perfumes em edição limitada, para ocasiões distintas e que compartilham uma característica: são os mais distantes da fragrância tradicional.


Embora a versão Taste of Fragrance (resenha aqui) tenha chegado ao mercado com a proposta de mostrar aos amantes de Angel uma faceta ainda mais gourmand, é a versão Eau Sucrée que traz, na minha opinião, uma identidade verdadeiramente gustativa.

Lançado em 2014, causou uma onda de compras quando chegou em solo brasileiro, esgotando os estoques das lojas que o disponibilizaram rapidamente. Com seu frasco, que segue o modelo do tradicional, em tons de azul mais claro e coberto de pedrinhas que lembram açúcar, não poderíamos esperar algo menos que doçura e mais doçura. Uma água açucarada, como o próprio nome diz.

Ao borrifá-lo em minha pele, sinto logo uma calda açucarada de cerejas, essa abertura poderia ser bem sintética, como sinto em outras fragrâncias, mas aqui ela é deliciosamente realista e dá água na boca. Essa abertura dura meia hora e se torna cada vez mais sutil, como uma leve lembrança ao longo da evolução.

Logo após essa calda sair de evidência, surge dominando tudo a nota que mais se pronuncia durante toda a evolução de Angel Eau Sucrée: o merengue. Aqui essa nota me lembra suspiro caseiro, o que me remete à infância, quando minha tia fazia tabuleiros de suspiro para depois das tardes de brincadeiras. 

Sutilmente, sinto também um acorde de patchuli que muito se assemelha ao usado nos recentes La Vie Est Belle e La Nuit Trésor, ambos da casa Lancôme. Talvez por isso e pela pegada gourmand, tenho lido algumas pessoas relatando semelhanças, que na minha pele se restringem ao uso da nota em questão. Até essa etapa e pelas seis horas que se seguem, a projeção é intensa.

Ao final da evolução, quase sete horas após borrifá-lo, sinto que o merengue fica mais suave e assume o posto de nota dominante a baunilha, aqui adocicada e aconchegante. A projeção cai para mediana e caminha lentamente para ficar mais rente à pele ao longo de mais três horas de evolução.

Com uma proposta gustativa e invernal, Angel Eau Sucrée se distancia um pouco dos acordes comumente utilizados na linha estelar. Isso ratifica o que eu disse em resenhas anteriores sobre a casa Thierry Mugler ter o poder de dar personalidade própria à flankers de grandes sucessos.


Os amantes de Angel querem usar sua estrela brilhante em todas as ocasiões, mas nem mesmo a versão Eau de Toilette (resenha aqui) é das mais indicadas para dias muito quentes. Pensando nisso, a casa lançou uma sequência de flankers de seus maiores sucessos em versões de EDT leves, quase colônias. A que resenharei a seguir será a versão Aqua Chic de 2013.

Seu frasco segue o padrão estelar do tradicional, entretanto a parte inferior vem em tons prateados, que dão um charmoso diferencial e passam um pouco da ideia "fresh" da fragrância contida nele.

Ao borrifá-lo na pele sinto logo uma miscelânea de todas as notas listadas em sua pirâmide olfativa, o que torna a fragrância linear e até mesmo simplória, mas nem por isso menos atrativa. 

Maçã verde aqui é bem realista, trazendo todo aquele frescor de quando descascada e se mistura muito bem a uma levemente adocicada flor de framboesa e um limpo e quase adstringente patchuli. Bem sutil, trazendo algum peso a essa mistura verde/fresca, um acorde de baunilha é a única remota lembrança da fragrância-mãe que sinto por aqui. Até o final da evolução, nenhuma mudança radical é notada e as notas seguem praticamente inalteradas.

Sua projeção é mediana nas três primeiras horas e mais rente à pele pelas quatro horas seguintes. Considero um desempenho bom para um perfume tão leve e fresco.

Amantes mais afoitos do EDP podem considerar que temos aqui uma perda de identidade na linha, mas creio que mesmo se distanciando do tradicional, Angel Aqua Chic é uma ótima alternativa no leque de estrelas Mugler para os dias mais quentes de verão, principalmente aqui no Brasil.  

domingo, 12 de julho de 2015

Especial Thierry Mugler - Resenha: Angel The Taste Of Fragrance


Existiria uma forma de deixar o "pai" dos gourmands ainda mais gustativo? A casa Thierry Mugler encontrou! 

Em um projeto que reuniu grandes mestres da cozinha francesa para dar sabor aos consagrados e icônicos Angel, A*Men, Alien e Womanity, foram criados pratos inspirados nas fragrâncias e adicionadas a elas, notas que as mergulharam no universo culinário.

Da coleção, possuo Angel e Alien (sobre o qual falarei nas próximas semanas) e posso garantir que dão realmente água na boca!

Angel The Taste of Fragrance (ou Le Gout Du Parfum), foi lançado em 2011 e seu toque gustativo e receitas inspiradas foram criados pela chef francesa Helene Darozze. 

Seu frasco, em tamanho único de 35 ml, é muito lindo! Seu formato me lembra uma pedra preciosa esculpida em forma inspirada na já conhecida estrela gourmand. O tom de azul utilizado e tampa transparente deram um toque ainda mais sofisticado, que permeia toda a criação.


Ao borrifá-lo na pele, sinto logo a nota que reinará absoluta por toda a evolução: o cacau em pó. Essa nota trouxe dois ótimos benefícios à essa fragrância: o primeiro é que o toque amargo e "poeirento" trouxe refinação à sinfonia de notas doces que sinto na versão EDP e o segundo foi ter acalmado o patchuli "sujo" que tanto me incomoda na fragrância-mãe.

Observando a pirâmide olfativa disponibilizada e acompanhando a evolução de Angel Taste of Fragrance, noto que foram adicionadas diversas frutas àquela base tradicional. Destaco na minha percepção olfativa pêssego bem maduro e adocicado, quase em ponto de calda açucarada a se misturar com a nota de cacau em pó. Sinto também um estratégico e bem posicionado maracujá bem azedinho, que funciona como uma ponta de leveza em meio às notas doces e pesadas.

Junto a essas notas frutais, acredito que com outras tantas escondidas, chocolate, caramelo e patchuli formam o velho acorde estelar ao qual nossos narizes já foram exaustivamente expostos (não que isso seja algo ruim, muito pelo contrário). 

Embora linear, é a versão mais próxima do tradicional que consegui me apaixonar, pois traz um equilíbrio em suas notas, com mais sofisticação e de forma menos agressiva. 

Quem está acostumado à projeção monstruosa da versão EDP, pode ficar decepcionado por uma projeção que varia de mediana a rente à pele. Fixação continua digna de um Mugler, com dez horas no total.


Acompanhe as demais resenhas já feitas no especial:

Angel EDP

Angel EDT

domingo, 5 de julho de 2015

Especial Thierry Mugler - Resenha: Angel Eau De Toilette


Quando a primeira fragrância estelar da casa Mugler foi lançada nos anos 90, trouxe consigo uma miscelânea de opiniões que até hoje se dividem entre amor e ódio. Entretanto, mesmo ousando em cada criação, flankers angelicais foram lançados para todos os gostos, trazendo sempre novos fãs à linha.

Uma característica bem marcante nas versões de perfumes da casa é a capacidade de manter a assinatura da "fragrância-mãe", mas sem que deixem de ter personalidade própria.

Angel Eau De Toilette foi a primeira de uma enorme série de flankers e, na minha opinião, a mais equilibrada delas.

A estrela brilhante que pairava sob nossas cabeças exalando doçuras e requinte se tornou um brilhante cometa, numa embalagem digna de coleção.


Do início ao fim, sinto a nota de patchuli, assinatura estelar, mas aqui ele está mais sóbrio, sem toda aquela robustez do original. Creio que a união dessa nota a um almíscar limpo e o toque amadeirado do cedro ajudaram a construir um acorde que ao mesmo tempo o manteve na proposta da linha e deu à ele personalidade própria. 

Embora as notas citadas acima predominem por toda a evolução, outras se destacam em uma pirâmide olfativa bem mais tímida que a de seu predecessor, mas que não deixa nada a desejar no resultado final. 

Na abertura, limão e pimenta rosa trazem frescor apimentado, mas sem exageros. Em contraste com as notas predominantes, já mostram que se trata de um perfume mais leve, mas não menos exótico e marcante.

Após meia hora o limão some e a pimenta se suaviza. Surge agora um mix de pralinê e cerejas maduras, que por influência do acorde "patchuli-limpo-amadeirado" não são adocicados ao extremo, mas trazem consigo o apelo gustativo. O coração gourmand é extremamente agradável e arranca muitos elogios com uma projeção notável, mas sem invadir o ambiente. Angel Eau de Toilette é daqueles perfumes que forma uma aura ao redor de quem usa e isso traz versatilidade.

Dez horas se passam até que ele se torne basicamente o acorde que citei no início da resenha. Finalmente as notas que estiveram presentes em todos os momentos tomam conta totalmente e casados com uma levíssima baunilha trazem conforto e aconchego com projeção rente à pele, mas notável, por mais três horas.   

O que mais me encanta nessa criação de Thierry Mugler é a certeira proposta de um perfume que representa a beleza de um cometa em aliança com uma fragrância luminosa, equilibrada, bela a marcante. Sem dúvidas um flanker digno e que merece ser conhecido por quem ama Angel, ou não.

quarta-feira, 1 de julho de 2015

Especial Thierry Mugler - Resenha: Angel Eau De Parfum, por Gabriel Villa


Quando moda, ousadia e sofisticação se traduzem em fragrâncias, marcos da perfumaria acontecem. Thierry Mugler não criou apenas perfumes incônicos e flankers de personalidade, mas um estilo único.

Desde que deu o pontapé inicial na onda dos gourmands até hoje, suas fragrâncias sempre fugiram do óbvio, utilizando notas diferenciadas ou dando novas roupagens à notas já consagradas. Sem fazer questão de agradar as grandes massas, suas criações devem ser apreciadas e compreendidas em seu contexto de criação para que a paixão aconteça.

Dentre estrelas magníficas, cometas brilhantes e visitantes de outro mundo, o mês de julho será dedicado à casa Thierry Mugler e seu inigualável catálogo de fragrâncias ímpares.



Uma estrela caída do céu: assim foi como Angel chegou às prateleiras das perfumarias no ano de 1992, em Paris. Os consumidores, ainda vestidos com a moda dos anos 80, e ainda se perfumando com os grandes florais de decote à base de tuberosas, foram pegos de surpresa com aquele frasco, e mais ainda com aquelas notas tão realistas que os faziam cheirar a sobremesas, contrastando com tantas frutas e com o patchouli matador que caracterizava os bons chypres de antigamente. Em Angel Eau de Parfum, tudo parecia muito escandaloso, muito dramático, trazendo assim a perfeita aura oitentista; mas também cheirava muito grotesco, inovador em excesso, chegando ao ponto de causar encantamento e respulsa, ambos em mesma quantidade.

O que vem confinado no icônico frasco de estrela é realmente uma explosão de notas gourmand com outras que, muito pouco provavelmente, funcionariam numa composição. O fato é que em Angel, tudo funcionou muito bem, fazendo daquele lançamento um sucesso futuro. Angel pode mesmo ser chamado de um perfume futurista, visto que dos anos 2000 para cá, tudo o que se lança é Angel, tudo o que se cheira é Angel; eis aí um perfume que dominou o planeta, direta e indiretamente, espalhando suas camadas aromáticas por tudo e todos, por mais tenebroso que isso possa parecer para alguns.

Angel foi idealizado para ser um perfume que lembrasse a infância do estilista Thierry Mugler. Dizem que ele se inspirou no perfume Nirmala de Molinard, usado por sua mãe; dizem também que ele teria se inspirado por um parque de diversões que lhe era familiar quando criança, e o que se pode tirar disso tudo é que um perfume com acordes de algodão doce e maçã do amor pode mesmo existir, para saciar os desejos de uma criança que não cresceu, para baixar as estrelas das constelações e nos iluminar, nos transportar pelas galáxias e nos abrir as portas de lugares imaginários que existem em nossas próprias mentes.

Ao borrifar Angel, meu mundo se torna azul escuro enquanto vejo explosões cósmicas ao meu redor, que me estonteiam com o perfume das mais suculentas frutas e do mais puro mel: sinto o damasco, o melão, a bergamota, enquanto que o mel domina o cenário e traz do nosso subconsciente um forte odor de tabaco, como que um charuto de mel e frutas. A partir daí, começo a sentir o patchouli arrasar minha consciência, me submeter aos seus caprichos e a sua vontade, enquanto que o chocolate escorre de minha pele com caramelo, sendo pontilhado pelo rosa intenso do algodão doce, com muito açúcar queimando na panela, e âmbar no fundo dando a secura e um pouquinho mais de calor. O perfume fica assim, com muito patchouli, com o chocolate a ficar mais amargo, mais em pó, enquanto que a baunilha também se mostra presente lá atrás e a orquídea tenta, sem sucesso, roubar a cena. O patchouli continua segurando tudo, lançando nos nossos narizes também um bocado de vetiver, e dando toda aquela sugestão de musgo de carvalho dos perfumes de outrora. E é por essas e outras que gosto de ver Angel como um bom chypre: uma abertura cítrica e uma explosão de patchouli e musgo (contrastando com notas adocicadas) como um bom chypre sempre foi. Mas aqui, temos um chypre adaptado para os anos 90, com as inovadoras notas gourmand (no lugar das usuais especiarias de antes) e as frutas aquosas dando o marco noventista que viria a ser utilizado depois até a exaustão em outros perfumes.

Se em Habanita de Molinard temos puro aroma de cigarros (com as flores macias e doces), se em Mitsouko de Guerlain sentimos o musgo com pêssego e canela, em Angel temos o sabor de uma xícara de chocolate quente, fumegante, lá no meio daquela brutalidade toda; brutalidade que, diga-se de passagem, dura eternamente em minha pele, e exala de forma a transformar quem o usa num ser celestial, a ser realmente reverenciado.

No entanto, não acho Angel um perfume “ignorante” como dizem; para mim, é um perfume até confortável, aconchegante, quente e macio como um abraço, sem se falar na elegância que projeta no ar. Pode-se fazer um efeito gigantesco e grandioso com apenas gotas, mas pra mim ainda é um efeito reconfortante, gostoso e viciante. E para Thierry Mugler, te considero e te admiro, por ter lançado um perfume de tamanha originalidade, e que soube brincar em ambos os lados, chypre e gourmand, com tamanha genialidade.